Família de garra

Sábado faço 30 anos.

Sábado a minha tia ( irmã da minha mãe) também faz anos. 

Dois dias depois faz anos o meu primo.

Sábado faz 8 anos que o meu avô morreu e tive de fazer uma viagem Algarve Porto sem parar, esquecendo-me completamente que fazia anos.

Sempre que faço anos lembro-me desse dia, olho nos anos da minha mãe e sei que ela se lembra que o dia que marca a data do nascimento da sua filha, marca também a morte do seu pai. 

Sempre que falo com a minha tia no dia dos nossos anos ela fala do pai que perdeu também. 

Sempre que dou um beijo ao meu primo no dia dos anos dele sei que ele se lembra do dia em que o nosso nosso avô, com quem ele cada vez está mais parecido, foi enterrado.

No entanto nunca, mas nunca deixamos que estas datas fossem marcadas pela morte, pela tristeza, ou que nos impedissem de festejar mais um ano de vida dos que ficam. Já festejamos em conjunto nos anos que se seguiram e sempre com animação. É claro que existe saudade, muita saudade sempre e um resquício de dor quando nos lembramos que ele não está cá para assistir a muitas das coisas que vivemos: o meu casamento, o nascimento de mais uma bisneta, o meu primo engenheiro formado e a trabalhar. Preferimos recordar o exemplo que ele nos deu como patriarca. Para ele era possível trabalhar no duro pelos filhos, viver no limiar da pobreza quando os filhos eram oito crianças e ao mesmo tempo levar o pequeno almoço à minha avó à cama. Era possível discutir, ralhar com os netos que estavam todos aos berros na sala na galhofa e manda-los brincar lá para fora e ao mesmo tempo brincar, como daquela vez, num magusto, que lhe pintaram a careca com cinza de assar castanhas. Costumo dizer que a milha família parece a máfia. As pessoas assumem que é pelo facto de ser muito numerosa, mas é muito mais do que isso. Somos muitos mas somos agarrados, somos muito mais que só muitos.